07 fevereiro 2014

Controle da poliomielite no Brasil e desafios para a saúde pública



Revista de Medicina e Saúde de Brasília
ARTIGO DE REVISÃO
________________________________________________________________________________ 1. Graduanda do curso de Gestão em Saúde Coletiva ‐ Universidade de Brasília  2. Doutor em Ciências na Área de Saúde Pública, pesquisador titular da Escola Nacional de Saúde  Pública ‐ Fiocruz ‐ RJ  3. Médico, doutor, pesquisador titular da Escola Nacional de Saúde Pública ‐ Fiocruz – RJ e docente  da Universidade Católica de Brasília ‐ DF  E-mail do primeiro autor: nayara_duraes@hotmail.com Recebido em 06/12/2013 Aceito, após revisão, em 26/12/2013
Controle da poliomielite no Brasil e desafios para a saúde pública
Poliomyelitis control in Brazil and challenges for public health
 Nayara Alarcão Ornelas Durães 1, José Fernando de Souza Verani 2, Vitor Laerte Pinto Junior 3 
A poliomielite tem comportamento epidêmico, sendo descritos surtos desde o final do século XIX nas Américas e na Europa. A partir de 1955, a Vacina Inativada (VIP) foi comercializada nos EUA, proporcionando drástica diminuição do número de casos. A Vacina Oral (VOP) foi descoberta por Sabin na década de 1960, permitindo a vacinação em massa e a imunidade de rebanho, obtendo sucesso na erradicação da transmissão da poliomielite selvagem na maior parte do planeta. Este estudo de revisão tem o objetivo de discutir a evolução das ações de saúde pública para a erradicação da transmissão do poliovírus selvagem no Brasil e os desafios relacionados à vacinação que se impõem ao clínico nos dias atuais. Desde 1990 não se registram casos de poliomielite por vírus selvagem no Brasil. Todavia, deve-se ter em mente que há o risco de reintrodução da doença no país, já que a transmissão autóctone poliovírus selvagem ainda não foi totalmente interrompida em alguns países como Nigéria, Paquistão e Afeganistão. Além disso, a Paralisia Associada ao Vírus Vacinal (VAPP) e a Síndrome Pós-Poliomielite são realidades em nosso meio. A circulação do vírus derivado da VOP (VDPV) deve continuara a ser objeto de vigilância e novas estratégias devem ser aplicadas objetivando a eliminação a doença pelo vírus vacinal. 
 A Poliomielite é uma doença infectocontagiosa aguda, causada por um vírus de RNA de cadeia simples da família Picornaviridae. Clinicamente sua manifestação mais grave é a inflamação encefálica que pode evoluir como quadro de paralisia flácida aguda com grande potencial de evolução para sequelas motoras permanentes.  A poliomielite tem comportamento epidêmico, sendo descritos surtos de maneira regular desde o final do século XIX nas Américas e na Europa. Em 1908, pela primeira vez, foi descrita a presença de uma “partícula filtrável” que poderia ser o agente etiológico da poliomielite em infecções experimentais de macacos. Posteriormente, a propagação do vírus em meios de cultura formados por células embriônicas proporcionou o avanço no conhecimento da patogenia viral. Em 1953, Salk avançou ao observar a presença de imunidade em indivíduos inoculados com pólio vírus inativado por formalina.  A partir de 1955 a vacina inativada (VIP) foi comercializada nos EUA e proporcionou drástica diminuição do número de casos. A vacina atenuada, conhecida também como vacina oral (VOP), foi descoberta por Sabin na década de 1960. A descoberta dessa vacina permitiu a introdução da vacinação em massa e a imunidade de rebanho, obtendo sucesso na erradicação da transmissão da poliomielite selvagem na maior parte do planeta.  Desde 1990 não se registram casos de poliomielite por vírus selvagem no Brasil, o que fez com que a doença se tornasse esquecida na formação do médico. Todavia deve-se ter em mente que há o risco de reintrodução da doença no país, já que a transmissão autóctone do poliovírus selvagem ainda não foi totalmente interrompida em alguns países como Nigéria, Paquistão e Afeganistão.  Além disso, a Poliomielite Associada ao Vírus Vacinal (VAPP: Vaccine- Associated Paralytic Polio) e a Síndrome Pós-Poliomielite são realidades em nosso meio. Este estudo de revisão tem o objetivo de discutir a evolução das ações de saúde pública para a erradicação da transmissão do poliovírus selvagem no Brasil e os desafios relacionados à vacinação que se impõem ao clínico nos dias atuais. 
Situação epidemiológica da poliomielite no brasil pré-campanhas de vacinação  Antes do início da vacinação, o Brasil sofria com altas taxas de incidência de poliomielite. No começo do século XX, já havia relatos de surtos e epidemias em algumas cidades do país. Os primeiros surtos foram relatados na cidade de São Paulo, em 1917, resultando na obrigatoriedade da notificação compulsória da doença nesse estado, onde a incidência, em 1960, chegou a 20 casos por 100.000 habitantes.4  No Rio de Janeiro, epidemias foram registradas nos anos de 1939 e 1953, desafiando as práticas de saúde da época. No ano de 1953, por  exemplo, foram  notificados  450 casos, sendo 27 fatais, motivando a necessidade de estratégias mais eficientes de imunização naquele estado e em todo o país.5,2 Cidades como Porto Alegre, Santos, Belém, Recife e Florianópolis também sofreram com surtos de poliomielite, entre as décadas de 1930 e 1940, demostrando a ampla disseminação da doença no território nacional.6  Alguns marcos políticos desde o inicio do século XX foram importantes para o desenvolvimento da estratégia de imunização contra a pólio. A lei nº 1.596, de 29/12/1917, foi precursora na notificação obrigatória da doença, reformulando o Serviço Sanitário de SP. A notificação compulsória no nível federal se deu com o decreto nº 16.300, de 1923, e, mesmo com falhas nos dados notificados, esse reconhecimento foi determinante para mensurar o impacto da doença em todo o país.  O desconhecimento sobre aspectos fundamentais da doença, tais como seu agente etiológico e epidemiologia, provocou incertezas que permearam as primeiras décadas do século passado, quando as recomendações que se tinham eram baseadas em premissas não científicas. A partir da década de 1940, a descoberta da via de transmissão da doença permitiu o aprofundamento nas pesquisas dos determinantes  da  doença  e  a  introdução  de  medidas de prevenção mais eficazes.   Seguindo as recomendações da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), o Brasil começou a utilizar, por volta de 1955, a vacina Salk. Discutia-se então, no país, qual seria a melhor vacina a ser utilizada diante do contexto epidemiológico da pólio na época. Em 1961, o Ministério da Saúde (MS) recomendou oficialmente a vacina Sabin, por ser de fácil aplicação, menor custo, sem efeitos colaterais e provocar ainda a imunidade de mucosas por meio de partículas do vírus vacinal. Provocava também, em decorrência da baixa cobertura de saneamento básico no país, “imunidade de rebanho” (herd immunity).  A vacina  oral começou a ser utilizada, no mesmo ano, em campanhas de vacinação realizadas inicialmente em pequenos municípios do estado de São Paulo e do Rio de Janeiro, e, em uma fase piloto, em algumas capitais do país. Todavia, na ocasião, os problemas de logística foram grandes limitadores dessas ações. Apesar dos problemas, a vacinação causou grande impacto na redução do número de casos nas cidades onde era realizada.  Barbosa e Stewien  relatam que houve uma redução do número de casos da doença, em São Paulo, a partir da vacinação em 1961, mas que a descontinuidade dessa estratégia levou ao aumento de sua ocorrência em 1971, salientando a importância da manutenção da elevada cobertura vacinal.   

Considerando que o controle da doença só se daria por meio de uma estratégia nacional com padronização de normas técnicas e estabelecimento de procedimentos para abastecimento e distribuição das vacinas e diante dos crescentes surtos de poliomielite e da incapacidade de controle por meio de campanhas de vacinação esporádicas e dispersas no território nacional, o MS criou o Plano Nacional de Controle da Poliomielite (PNCP) em 1971. O PNCP teve papel fundamental na organização e planejamento das campanhas e na utilização da VOP. Todavia, nos anos de 1971 a 1973, o plano foi executado somente em 14 estados.  Outro marco foi o Programa Nacional de Imunização (PNI), criado em 1973, fruto do Plano Decenal de Saúde para Américas, elaborado na 3ª Reunião de Ministros de Saúde das Américas, no Chile, em 1972, onde a proposta era reduzir com vacinação, a morbidade e mortalidade por doenças evitáveis por vacinas. Referência mundial em imunização, o PNI realizou ações de imunização e vigilância epidemiológica de surtos da pólio.  As criações do PNCP e do PNI foram influenciadas pela exitosa Campanha de Erradicação da Varíola (CEV), concluída em 1973. Esses dois programas foram concebidos,  levando-se   em   consideração  o modelo preventivista das doenças transmissíveis. Esse modelo previa o controle das doenças por meio de estratégias de imunização, da participação da sociedade, de vigilância epidemiológica e de monitoramento governamental.   Em consonância com esse processo, a Fundação de Serviços Especiais de Saúde Pública (FSESP) implantou o Sistema Nacional de Vigilância Epidemiológica (SNVE), em 1975, que permitiu o estabelecimento de medidas estratégicas de vigilância no combate a diversas doenças, inclusive a poliomielite. O SNVE consolidou normas, técnicas e políticas para o melhor funcionamento da vigilância epidemiológica em todo o país, trazendo importantes conceitos para notificação e investigação de casos, compreendendo as ações de vigilância epidemiologia. Seguiu-se a criação do Sistema Nacional de Laboratórios de Saúde Pública, que aprimorou as práticas de vigilância epidemiológica no país. Apesar do amplo avanço no conhecimento sobre a transmissão e a prevenção da poliomielite e a disponibilidade da vacina com alta efetividade, a década de 1970 foi marcada pela incapacidade de articular a política nacional de erradicação da poliomielite em todo o território do país. A utilização   da   vacina   de   forma   esparsa  e descontinuada fazia com que a doença persistisse como um problema de saúde pública, nos anos seguintes.
Dia nacional de vacinação.  A proposta do Dia Nacional de Vacinação (DNV) visava atingir parcelas da população que não se vacinariam, por uma série de dificuldades, na rotina das unidades de saúde. Essa estratégia facilitava o acesso à vacinação em períodos previamente definidos por meio de divulgação na mídia, permitindo, assim, o alcance da meta de 100% de cobertura vacinal com a VOP. Para consecução desses objetivos, houve a necessidade de intensa articulação política por parte dos técnicos do MS. Treinamentos e reuniões de planejamento ocorreram em todos os estados. O planejamento para a vacinação em massa envolveu um grande esforço na capacitação de profissionais e na estruturação das campanhas. A articulação política realizada pelas autoridades de saúde, o que permitiu sensibilizar os governantes e setores privados da sociedade, foi parte essencial para a realização da vacinação em massa. Destacando a complexidade que a poliomielite se configurava até então, e, portanto, a necessidade da imunização, os Dias Nacionais de Vacinação iniciaram em 1980, em todo o território nacional, ocorrendo em duas etapas, a primeira em junho e a segunda em agosto, quando são vacinadas/revacinadas todas as crianças menores de cinco anos.  Entre os anos 1980 a 1986, o baixo nível de cobertura vacinal influenciou no número de ocorrência de casos novos, deixando número considerável de susceptíveis devido às falhas na imunização.  Na Região Nordeste, um surto de casos de poliomielite em 1986, causado pelo sorotipo 3, levou à realização de campanhas de vacinação para aquela região com vacinas reformuladas, ou seja, com maior quantidade de partículas do poliovírus tipo 3. O último caso de poliomielite no país foi na Paraíba, no município de Souza, em 1989. O esquema brasileiro de imunização, “Dia Nacional de Vacinação”, foi recomendado pela OPAS/OMS como modelo a ser seguido por outros países. Nas Américas, o sucesso obtido no controle da poliomielite no Brasil, estimulou os países membros da OPAS, durante a XXXI Reunião do Conselho Diretivo, em setembro de 1985, a concordarem com a importância da eliminação da poliomielite, bem como se comprometerem a erradicar sua transmissão nas Américas até 1990. Para tanto, foram intensificadas as estratégias de imunização contra a doença, utilizando a vacina Sabin em dias nacionais de vacinação em massa, e ações de vigilância extremamente sensíveis e ativas, levando à eliminação da circulação do poliovírus selvagem no continente.  A ocorrência do último caso de paralisia nas Américas foi em 1991, no Peru. No contexto global, em 1988, a Organização Mundial de Saúde (OMS) instituíra, como meta, a erradicação da poliomielite até o ano 2000, a partir do lançamento do Plano Global de Erradicação do poliovírus selvagem no ano anterior. O excelente resultado obtido pela política de erradicação da poliomielite no Brasil se deu principalmente pela priorização dada, pelo governo federal, para o seu planejamento e execução, além do sucesso obtido na mobilização da população. Segundo Verani, “a sistematização de técnicas operacionais, epidemiológicas e imunobiológicas foram experiências deixadas pela imunização contra a varíola, contribuindo fortemente para o desenvolvimento da atividade de imunização contra a poliomielite”. O PNI foi reflexo da responsabilização política no Brasil, considerando que, em outros países, o Programa Ampliado de Imunização era instituído, impactando em outras doenças imunopreveníveis. Dentro do MS, em 1986, foi criado Grupo de Trabalho para Erradicação da Poliomielite (GT - POLIO), colaborando com pesquisas, estudos e trabalho referentes à doença.  Em 1994, o Brasil obteve da OPAS, o   Certificado  de  Erradicação   da  Transmissão  Autóctone do poliovírus selvagem. As campanhas continuam a ser realizadas, duas vezes por ano, quando são vacinadas/revacinadas, indiscriminadamente, todas as crianças menores de cinco anos.  Para se ter uma noção da grandiosidade dessa ação de saúde pública, na campanha de junho de 2012 foram distribuídas 23 milhões de doses da VOP, ao custo de R$ 16,7 milhões, comum investimento total estimado de R$35,3 milhões; foram acionados aproximadamente 115 mil postos de vacinação, cerca de 350 mil pessoas e utilizados cerca de 42 mil veículos. Entre 2006 a 2011, o melhor índice de cobertura vacinal foi no grupo etário <1 ano, ultrapassando 100%; as outras faixas alcançaram índices acima de 90%.   Mesmo tendo alcançando com sucesso o objetivo de erradicar a doença no território nacional, as campanhas de vacinação em dias nacionais continuam sendo a principal medida para manter a poliomielite erradicada no Brasil. Essa estratégia é justificada pela persistência da transmissão do vírus selvagem em alguns países do mundo e, portanto, pela possibilidade de reintrodução do vírus em um cenário de baixa cobertura vacinal. O principal problema advindo dessa política é a incidência de casos de poliomielite ocasionada pelo próprio vírus vacinal. 
Problemas e dilemas sobre a melhor estratégia de vacinação  Foram detectados 48 casos VAPP, com sequelas permanentes, em mais de um bilhão de doses aplicadas no país entre 1989 a agosto de 2011. Isso acontece pela característica da VOP, produzida a partir do vírus vivo, que pode sofrer mutações, no ambiente ou no organismo susceptível, recuperando sua patogenicidade e causando a doença. No Brasil, o risco estimado da doença associada aos vírus vacinais é de 1:1,2 a 1:2,4 milhões de doses após a primeira dose; para as doses seguintes, o risco passa de 1:3,6 a 1:13,0 milhões de doses. A grande vantagem da VOP, além do desenvolvimento da imunidade individual, é a eliminação do vírus vacinal no ambiente que provoca a “imunidade de rebanho” por meio de sua transmissão fecal-oral, sendo esse processo facilitado sob condições de precariedade do sistema de saneamento básico.  Contudo, a possível circulação do vírus vacinal derivado da VOP (VDPV- Vaccine Derived Polio Virus) no meio ambiente representa riscos em um possível cenário futuro, quando for alcançada a meta de erradicação da transmissão autóctone do poliovírus selvagem de forma global. A vacinação não faria mais sentido, em um contexto epidemiológico, em que o risco de adoecer por infecção do poliovírus selvagem fosse inexistente. Por outro lado, a utilização massiva da VOP possibilita a circulação de vírus derivados da vacina, configurando assim um dilema para a saúde pública. Ou seja, a transmissão do vírus derivado da vacina passa a constituir o verdadeiro risco de adoecer, no entanto, deve-se considerar que a circulação do vírus vacinal no meio ambiente é limitada no tempo e no espaço, enquanto houver suscetíveis, em número suficiente para dar continuidade à cadeia de transmissão. Em um cenário de altas e homogêneas coberturas vacinais com duas doses da vacina de vírus inativado, VIP (Salk), a cadeia de transmissão do poliovírus derivado da vacina VOP tenderá a ser interrompida.  Entretanto, mudanças nas estratégias de imunização, tais como a escolha da vacina mais adequada para o atual contexto epidemiológico da doença no Brasil, não são feitas de modo rápido ou fácil, principalmente quando já se tem estabelecida a aceitação cultural da política de campanhas de vacinação com VOP. Seguindo a recomendação da OPAS, os países das Américas que utilizam a vacina oral foram orientados a introduzir, gradativamente, a vacina inativada no Calendário Básico Vacinal, utilizando, como reforço, a sequencia de doses da vacina oral. O Brasil atendeu a essa recomendação, em 2012, quando o Calendário Básico de Vacinação da criança foi ampliado pelo Ministério da Saúde. Desde então, foi inserida a vacina com vírus inativado contra a Poliomielite, nas doses aplicadas no segundo e quarto mês de vida da criança. As doses subsequentes da vacina oral e as campanhas nacionais para menores de cinco anos, também foram mantidas. Nos Estados Unidos, o processo de introdução da VIP no calendário de imunização se deu há alguns anos. O último caso registrado da doença foi em 1979, sendo que a utilização da vacina oral começou por volta de 1960 com elevada cobertura vacinal, com índices entre 85 a 99%. A transição da vacina VOP para VIP teve inicio em 1997. No Brasil, esse processo de utilização da nova vacina começa 15 anos depois. Argentina e Uruguai também introduzem a VIP em 2012.   Um aspecto das campanhas de vacinação que ainda merece discussão diz respeito às elevadas taxas de cobertura obtidas. Inquéritos de cobertura vacinal têm demonstrado algumas limitações na realização das campanhas, tais como contabilização de crianças vacinadas a partir do número de doses aplicadas. Outro aspecto refere-se à não participação de alguns grupos específicos. Barata et al.12 realizaram um estudo que investigou as desigualdades socioeconômicas da cobertura vacinal, concluindo que, apesar da positiva avaliação do esquema vacinal do Brasil, comparativamente a outros países, foi em crianças de família de menor renda que essas políticas surtiram mais efeito. Crianças de família de padrão socioeconômico maior apresentaram maiores índices de cartões vacinais incompletos. Eventos adversos pós- vacinais foram um dos fatores associados a não participação em campanhas de vacinação, assim como a baixa escolaridade materna, contribuindo para a falta de informações.  Em outro inquérito, que analisou a cobertura vacinal contra a pólio, em crianças, nas 26 capitais de estados brasileiros e o Distrito Federal, apresentou-se dados sobre o impacto dos “dias nacionais de vacinação” na completitude do esquema vacinal. No Brasil, 15% das crianças participaram dessa estratégia para completar seus cartões de vacinação. Observou-se que na Região Norte, onde os índices de cobertura vacinal são menores na comparação nacional, a vacinação em massa obteve um efeito reduzido; 12% das crianças completaram seus cartões.
No mundo todo, no inicio do século passado, a poliomielite representou um grave problema de saúde pública. Décadas se passaram e a eliminação da circulação do poliovírus selvagem foi alcançada em quase todos os países. Isso foi possível devido à eficientes programas e estratégias de imunização contra a doença e da vigilância epidemiológica e laboratorial. Atualmente a persistência da circulação de forma endêmica do vírus selvagem em três países e a possibilidade de evento paralítico em decorrência da vacina são as principais preocupações dos organismos ligados à saúde no Mundo.  A circulação do vírus derivado da VOP passa a ser motivo de investigação, considerado que o contato com este será a única maneira de infecção da doença. O pequeno risco de eventos pós-vacinais já são alvo de discussão, mostrando a importância da avaliação do uso dos diferentes tipos de vacinas (VOP e VIP). O CDC e a OMS preveem, além do fim da vacinação com Sabin, o necessário planejamento para possíveis surtos na população não vacinada.  O possível contato com o vírus selvagem, em populações com baixa cobertura, mesmo em cenários com boas condições de saneamento básico, representaria um verdadeiro desastre sanitário. Portanto, as mudanças nas políticas de vacinação exigem evidências sólidas, oriundas de pesquisas e planejamento que levem em consideração as condições sanitárias e epidemiológicas no mundo. Dessa forma, os riscos de infecção com o poliovírus, selvagem ou derivado da vacina, serão inexistentes ou aceitavelmente reduzidos.  Enquanto não se tem estratégias bem definidas num contexto mundial, principalmente diante da persistência da transmissão do vírus selvagem, em alguns cenários de instabilidade política e social, a manutenção de altas coberturas vacinais das 2 vacinas, VOP e IPV, é imprescindível. Todavia, novas estratégias devem ser aplicadas com o objetivo de se eliminar a doença pelo vírus vacinal, considerando esse o maior problema enfrentado em nosso meio atualmente. As ações de vigilância epidemiológica e de monitoramento constante na forma de busca ativa de casos suspeitos (Paralisias Flácidas Agudas), e de sua confirmação oportuna, devem ser mantidas e ampliadas, visando não só a avaliação das políticas de controle bem como o adequado encaminhamento dos casos suspeitos.  

30 janeiro 2014

Gerenciamento da dor na Síndrome Pós-poliomielite: estudo de caso.

Marco Orsini, Nelson Kale Júnior, Mariana Pimentel Mello, Dionis Machado, Victor Hugo Bastos, Daniel Joppert, Carlos Henrique Melo Reis, Júlio Guilherme Silva, Acary Bulle Oliveira, Sara Lúcia de Menezes, Marcos Raimundo de Freitas




A Síndrome Pós-Pólio (SPP) caracteriza-se por um novo episódio de fraqueza muscular e/ou fadiga muscular anormal em indivíduos que apresentaram poliomielite anterior aguda (PAA) anos antes. Ainda são poucos os relatos na literatura sobre o gerenciamento da dor na SSP. O objetivo deste trabalho é analisar o controle da dor na síndrome pós-pólio por meio de um relato de caso. Um homem de 57 anos com SPP foi submetido a 24 sessões de fisioterapia para controle do quadro álgico na síndrome, baseada em recursos eletrotermofototerápicos e cinesioterapia. Para análise da dor pré e pós-intervenção fisioterapêutica foram aplicados dois instrumentos: a Escala Analógica Visual (EVA) e a Intensidade de Dor Presente (ID). O quadro álgico no joelho direito sofreu redução de grau 8 para 4 pela EVA e grau 5 para 2 pela ID, enquanto a dor no tornozelo direito reduziu de grau 2 pela EVA e grau 1 pela ID para zero em ambas as escalas. A dor é apontada como um sintoma predominante por muitos pacientes com SPP. O sujeito deste relato, após o programa de tratamento, apresentou melhora expressiva da dor. Entretanto, devido à escassez da literatura sobre dados substanciais referentes ao seu gerenciamento, especialmente na fisioterapia, novos estudos devem ser propostos para gerar maior fundamentação teórica à abordagem fisioterapêutica na SPP.
Poliomielite Anterior Aguda (PAA) é uma doença endêmica humana causada por um enterovírus de distribuição mundial que se apresenta sob a forma bifásica. Seus sintomas iniciais são quadro de febre, cefaleia e gastrointestinais, seguidos por uma rápida paralisia de caráter assimétrico, decorrente do comprometimento dos neurônios motores da ponta anterior da medula espinhal 1,2. Inúmeros pacientes que desenvolveram a doença durante as epidemias das décadas de 1940 e 1950 passaram a apresentar os efeitos tardios da PAA, que incluem um novo quadro de fraqueza muscular associada à fadiga anormal, atrofia e dor, caracterizando uma condição conhecida como Síndrome Pós-Poliomielite (SPP). Tais efeitos estão relacionados aos danos causados pelo vírus na fase aguda e à relativa atividade física durante a fase de estabilidade clínica, provocando a degeneração dos brotamentos axonais das unidades motoras gigantes que se desenvolveram durante a recuperação da PAA2. A incidência e prevalência da SPP são desconhecidas no mundo e no Brasil. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se 12 milhões de pessoas em todo o mundo com algum grau de limitação física causada pela poliomielite5. A dor nos músculos e nas articulações é o primeiro ou segundo sintoma mais comum relatado pelos pacientes, na maioria dos estudos. No que diz respeito à dor muscular, foi referida por 43 a 80% dos indivíduos com pós-poliomielite no trabalho desenvolvido por Chetwynd et al.6. Apesar de a dor constituir um sintoma sine qua non para direcionamento das propostas terapêuticas na SPP, ainda são escassos os relatos na literatura sobre o referido sintoma, tanto no âmbito clínico quanto no campo da fisioterapia. Especialmente pelo número pequeno de casos, já que a doença vem sendo erradicada em nosso país desde 1989 com a ação da vacinação em massa de crianças. Baseado nesta premissa, o presente trabalho visa analisar, por meio de um relato de caso, o efeito de uma estratégia fisioterapêutica no gerencia- mento da dor na SSP.
METODOLOGIA Relato de caso O estudo foi realizado no Serviço de Reabilitação Neurológica da Associação Niteroiense de Deficientes Físicos (ANDEF). A concordância em participar da pesquisa foi obtida a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), conforme preconizado pela Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde e aprovado pelo Comitê de Ética da instituição, sob o número 043/2009. PCG, masculino, 57 anos, professor, relata que no primeiro ano de vida apresentou quadro de PAA que levou ao comprometi- mento do membro inferior direito, gerando deficiência física com limitação relacionada principalmente à deambulação. Após quatro décadas de estabilidade clínica, deu-se início um novo evento de perda funcional, principalmente com dificuldades em subir e descer escadas e executar longas caminhadas. Em maio de 2009, recebeu o diagnóstico de SPP. O exame clínico apresentou encurtamento de 17,3 cm no membro inferior direito, deformidade em equino- cavo-varo com bloqueio da articulação tibiotársica, genu recurvatum, genu valgo e paresia dos músculos proximais e intermediários, com paralisia dos grupamentos distais. Locomovia-se com uso de muleta canadense, com apoio do membro superior esquerdo, sem compensação ortopédica como palmilha ou outro recurso ortótico para diferença entre os membros. Realizava, o apoio no solo com os dedos do membro inferior direito em hiperextensão. Não havia evidência de derrame articular significativo nas articulações do membro inferior direito. Relatava intenso quadro álgico espontâneo na articulação do joelho tíbio-társica direito. As escalas utilizadas para quantificar a dor foram Visual Analógica (EVA) e a Intensidade da sua Dor Presente (ID), antes e após as sessões de fisioterapia 7,8. A EVA é muito utilizada e consiste em quantificar a dor com uma régua com valores de 0 a 10 sendo que o primeiro representando sem dor e o outro, dor insuportável. A articulação do joelho direito apresentava grau 8 pela EVA e grau 5 pela ID e havia algia mais branda na articulação tíbiotársica direita (grau 2 pela EVA, grau 1 pela ID). A sintomatologia dolorosa intensificava durante palpação articular das respectivas regiões, principalmente quando em posição ortostática e durante a deambulação.
Procedimento O sujeito foi submetido a uma avaliação neurológica e ortopédica com duração aproximada de 60 minutos. Enfatizou-se o exame de força muscular, a análise dos reflexos, análise cinemática do membro inferior e a análise da intensidade e reatividade da dor. A análise cinemático- funcional foi conduzida de acordo com a proposta de avaliação qualitativa de Kisner & Colby9 no que tange os movimentos os- teocinemáticos e artocinemáticos, como também a sensação final de movimento, movimento ativo e passivo de todas as articulações do membro inferior. Após a coleta de dados iniciais, foi definida a abordagem terapêutica em- pregada. Foram três meses de tratamento fisioterapêutico, que totalizou 24 atendi- mentos (frequência de dois semanais com a duração de 50 minutos por sessão). No término deste período, realizou-se uma reavaliação do quadro, com ênfase das variáveis analisadas previamente (força, reflexos, intensidade da dor e análise cinemática do membro inferior). Após avaliação física, concluiu-se que a sintomatologia dolorosa tinha causa articular proveniente das adaptações pósturo funcionais do membro inferior direito. Sendo assim, optou-se por uma abordagem fisioterapêutica que associava a aplicação de Estimulação Elétrica Transcutânea (TENS), Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation (Laser), mobiliza- ção articular pelo conceito Maitland, cinesioterapia passiva com técnicas de alongamento e flexibilização muscular dos grandes grupamentos musculares do membro inferior e estabilização articular por meio de bandagens funcionais. A execução do programa terapêutico seguiu rigorosamente esta sequência. Todas as técnicas descritas apresentam efeito justificado para auxiliar na redução do quadro álgico e promover melhores condições nas atividades de vida diária. A proposta de tratamento iniciou com a aplicação do TENS, modo convencional, com frequência de 120 pulsos por segundo e duração de 150 milissegundos na articulação do quadril direito, e frequência de 90 pulsos por segundo com amplitude de 120 milissegundos para a articulação do joelho, durante 20 minutos em cada região. A intensidade foi modula- da em um nível sensorial forte, modificada  constantemente para a manutenção de uma sensação de formigamento intenso na região aplicada. Esta modalidade terapêutica tem efeito na supressão da dor com base na teoria “das comportas”. Em sequência aplicou-se o laser de Arseneto de Gálio, 904 mm, modo de aplicação pontual, em ambas as articulações, com dosagem de 3 J/cm2 na área em que se localizava a dor – cerca de 5 pontos na região medial tibiotársica do membro inferior direito e 9 pontos na região póstero-medial do joelho direito. Ao Laser atribui-se a possibilidade de controlar o processo inflamatório e a dor, além de favorecer o processo de cicatrização e melhorar vascularização tecidual por estimular a neovascularização. O estímulo das mitocôndrias celulares gera efeito bioenergético de aumento na produção de ATP intracelular; favorece a produção de ácido araquidônico e a transformação de prostaglandina em prostaciclina, justificando sua ação na melhora do edema e redução da inflamação; promove aumento da endorfina circulante, proporcionando o efeito analgésico na dor inflamatória; e estimula a regeneração celular10. Em seguida, executou-se uma série específica de mobilização e contenção articular em joelho e tornozelo do membro inferior direito. Estas técnicas (mobilização articular, estiramento muscular mantido e bandagem funcional) tinham o intuito de favorecer um alinhamento segmentar mais fisiológico, visto que o quadro álgico em joelho e tornozelo direito poderia estar ligado ao uso funcional do seguimento com as deformidades articulares presentes. Desta forma, estas manobras buscavam promover um arranjo articular mais próximo da harmonia, isto é, contrário ao padrão deformante. Como abordagem manual realizada nas deformidades genu recurvatum e genu valgo, iniciamos com mobilização da articulação patelo-femural com ênfase nas direções crânio-caudal e látero-medial da patela. A articulação fêmuro-tibial direita foi decoaptada por meio de uma tração axial associada a movimentos de circundução com o joelho em semiflexão. Esta manobra favorece uma melhor organização das estruturas intrarticulares, sendo realizada com o terapeuta segurando o pé do paciente entre suas pernas e inclinando seu corpo levemente para trás para promover a tração axial, enquanto ambas as mãos estão em torno da tíbia, na altura da tuberosidade anterior da tíbia, realizando movimentos de circundução. Tais manobras foram aplicadas durante aproximadamente cinco minutos cada9. As cadeias musculares anterior e lateral de quadril e coxa do membro inferior direito foram alongadas passiva- mente com estiramentos mantidos por aproximadamente 20 segundos em 3 séries com intervalos de 20 segundos. Os músculos alongados foram: glúteo médio, tensor da fáscia lata, iliopsoas, sartório e quadríceps. Após esta sequência de mobilizações e exercícios, foi realizada a estabilização articular com a aplicação de esparadrapos, técnica denominada bandagem funcional. No joelho, foi realizada a técnica de contenção para genu valgo, colocando estabilizadores em “xis” na face medial do joelho, cruzando por sobre o ligamento colateral medial. Como as deformidades presentes no tornozelo e pé direito se encontravam fixadas, realizamos apenas o deslizamento posterior do talus em relação à tíbia, devido à posição equina do pé, e a mobilização do calcâneo em direção lateral decorrente ao varismo apresentado. A estabilização articular foi feita seguindo a técnica de correção para retro pé varo, com tiras de esparadrapo colocadas em “U”, fixadas inicialmente no terço inferomedial da tíbia, passando inferiormente ao calcâneo, e fixadas na face lateral do terço inferior da perna. O componente cavo foi mantido por opção. Esta estabilização provoca tração na base do calcâneo e estimula a referida estrutura a assumir posição mais fisiológica.
O paciente do presente estudo ainda recebeu orientações para controle da dor e conservação de energia, dentre elas: manutenção do peso, o repouso e a correta utilização de equipamentos de assistência para deambulação.
RESULTADOS No início, o paciente apresentava dor no joelho direito grau 8 pela EVA e 5 pela ID, respectivamente traduzidas por intensa e insuportável. Na articulação tibiotársica direita, a dor percebida foi graduada como 2 pela EVA e 1 pela ID, respectivamente definidas como  leve e fraca. Após 12 sessões, a dor no joelho tinha reduzido de 8 para 5 pela EVA e de 5 para 3 pela ID, enquanto na articulação tibiotársica direita presenciamos uma diminuição de 2 para 1 pela EVA e de 1 para 0 pela ID. Tendo como base os índices obtidos sobre a percepção da dor inicialmente, ao final das 24 sessões, que totalizaram 90 dias, contabilizou-se redução inicial de 50% na dor do joelho direito pela EVA (de 8 para 4) nos primeiros 15 dias (4 sessões), enquanto pela ID constatou- se decréscimo de 60% (5 para 2). A dor percebida na articulação tibiotársica direita foi reduzida em 100% em ambas as escalas nas 20 sessões. Além disso, houve relato de uma maior facilidade para deambular, pois apesar de apresentar dores, a intensidade e frequência eram indubitavelmente menores. O acompanhamento da dor do paciente frente ao tempo de tratamento.
Tratamento da dor na Síndrome Pós-pólio
DISCUSSÃO A SPP é uma doença lentamente progressiva, com início geralmente insidioso, que pode levar a deficiências e incapacidades, acarretando restrições funcionais nas atividades básicas e instrumentais da vida diária. Caracteriza-se pelo desenvolvimento de novos sintomas neuromusculares, após um mínimo de 15 anos de estabilidade clínica. O intervalo médio entre a PAA e as primeiras manifestações da SPP é de aproximada- mente 35 anos.  As manifestações clínicas mais frequentemente encontradas são fraqueza muscular, fadiga e dor. A dor é apontada como um sintoma predominante por muitos pacientes, como o do presente estudo, podendo ser de origem muscular, articular ou mioarticular. É mais frequente nos membros inferiores, e no dorso daqueles capazes de deambular, e nos membros superiores dos que utilizam cadeiras de rodas ou muletas, estando geralmente associada ao uso excessivo da musculatura remanescente. Pacientes com dor podem limitar suas atividades físicas, desenvolvendo fraqueza e atrofia por desuso secundariamente. A intolerância ao frio também é um sintoma comumente relatado. As mulheres são mais recorrentes em reportar dores musculares e/ou articulares na SPP. Um maior número de unidades motoras recrutadas e fraqueza acentuada das extremidades inferiores podem ser fatores adicionais importantes para determinar a dor nas articulações. Ambas as dores (musculares e articulares) estão associadas à redução na qualidade de vida. Em vista disso, é altamente recomendável que os indivíduos com efeitos tardios da poliomielite, principal- mente com dor e câimbras, modifiquem seu nível de atividade física. Embora a etiologia da SPP seja desconhecida, hipóteses relacionadas a mecanismos autoimunes apontam a presença de bandas oligloconais e linfócitos no líquor e na medula espinhal de alguns pacientes, além da persistência do poliovírus no sistema nervoso central, demonstrado pelo acúmulo de anticorpos do tipo imunoglobulina M (IgM) no líquor de pacientes com SPP.  Entretanto, a teoria mais provável faz relação ao uso excessivo das unidades motoras remanescentes ao longo dos anos numa demanda metabólica intensa. O vírus pode danificar até 95% dos neurônios motores da medula espinhal, ou mesmo 100% em pelo menos 50% dos pacientes.  Com a lesão desses neurônios, os músculos de sua área de atuação tornam-se desnervados, ocasionando paresia e atrofia. Embora danificados, os neurônios remanescentes compensam o dano enviando ramificações para ativar os músculos antes desnervados. Em vista disso, a função neuromuscular é recuperada, parcial ou totalmente, dependendo do número de neurônios envolvidos no processo. Um único neurônio pode lançar derivações para conectar cinco a dez vezes mais fibras musculares do que fazia originalmente. O grande problema dá-se quando tal população de neurônios remanescentes é sobrecarregada por muitos anos. Inicia-se um novo processo degenerativo com surgimento de um novo quadro sintomatológico20. Os possíveis fatores de risco para o desenvolvimento da SPP estão ligados à gravidade da PAA, sexo feminino, idade avançada na época do episódio, deficiências permanentes após a recuperação, ganho recente de peso e maior atividade física durante o período de estabilidade. O indivíduo apresentado em nosso estudo realizou intensa atividade física durante a fase de estabilidade clínica, fator apontado como um dos principais agentes etiológicos envolvidos na gênese da SPP. Os principais critérios para se estabelecer o diagnóstico de SPP são: história confirmada de PAA, período de recuperação parcial ou completa, seguido de um período de estabilidade clínica de pelo menos 15 anos, início gradual, ou raramente abrupto, de nova fraqueza muscular ou fadiga anormal, e a exclusão de outras condições neurológicas ou ortopédicas. Vale ressaltar que o paciente estudado apresenta os critérios supracitados. Sabe-se que o controle da dor pode ser realizado por uso de calor, frio, eletroterapia e medicamentos, entretanto as atividades de alongamento e “fortalecimento” são fundamentais por atuarem de maneira direta na articulação e no músculo. Mesmo não sendo o foco deste estudo, os exercícios de fortalecimento muscular têm contribuído para o gerenciamento da dor. Estudos não controlados envolvendo exercícios isotônicos, isocinéticos e isométricos mostraram-se eficazes na redução da fadiga, da fraqueza muscular e da dor em pacientes portadores da SPP. Programas terapêuticos controlados, incluindo treino ergométrico em membros superiores e inferiores, condicionamento de marcha, exercícios aeróbicos e atividades aquáticas, também forneceram resultados significativos nessa mesma população. Os indivíduos que padecem de síndrome pós-polio devem ser submetidos a atividades terapêuticas (cinesioterapia) em limites submáximos. A proposta terapêutica descrita neste relato de caso tem como ponto norteador as atividades funcionais e o controle da dor. Sendo assim, justifica-se a utilização de recursos pré-cinesioterapêuticos, como o TENS e o Laser, para o gerenciamento da dor e a permissão de que haja melhor resposta funcional do membro acometido pela pólio. Uma grande vantagem da aplicação do TENS e Laser é o efeito analgésico e de controle inflamatório e a restrição do uso da crioterapia, já que cerca de 70% dos pacientes apresentam intolerância ao frio6. No que tange a prática de exercícios ativos livres, entram em consonância com as recomendações de diversos estudos sobre apenas a necessidade de recrutamento muscular sem gerar fadiga. Portanto, eles e as técnicas de alongamento têm a capacidade minimizar os danos do desuso sem gerar sobrecarga9. Referente à utilização da bandagem, neste relato de caso o recurso tem o intuito de promover a funcionalidade e um padrão de posicionamento articular contra as mudanças estruturais articulares desencadeadas pela pólio. Com a sua otimização pela técnica de Maitland, que objetiva a melhorar da artrocinemática e minimizar o quadro álgico articular9, a proposta de nosso estudo pode promover resultados satisfatórios no controle da dor. As deficiências causadas pelo surgi- mento dos novos sintomas, somadas às deficiências primárias provocadas pela PAA, provocam grandes restrições. As intervenções terapêuticas na SPP têm como objetivo fornecer aos pacientes princípios e métodos para o autocuidado, efetuando mudanças no estilo de vida e reduzindo a carga metabólica excessiva sobre os neurônios motores. As condutas terapêuticas adotadas devem preconizar a utilização de técnicas de conservação de energia, orientações sobre períodos regulares de repouso, perda de peso e prática de exercícios em níveis que evitem o uso excessivo, além de indicação para a utilização de órteses, quando necessário. O ponto -chave do tratamento é prevenir a deterioração subsequente por meio do equilíbrio entre a atividade e o repouso, buscando descrever a frequência, a intensidade e o impacto da dor em indivíduos vitimados pela SPP, realizaram um estudo retrospectivo e crosssectional com 63 pacientes com dores em diversas regiões do corpo. Os locais de maior frequência foram os ombros, a coluna lombar, as pernas e os quadris. Com relação à intensidade da dor, joelho, pernas, punhos, coluna lombar e a cabeça (cefaleia) foram às áreas mais frequentemente comprometidas. A presença de dor contribuiu negativamente na qualidade do sono e na execução de atividades da vida diária que exigiam um intenso trabalho muscular. Conde et al.20 tiveram o intuito de descrever os aspectos clínicos e epidemiológicos de pacientes com SPP, além de identificar os fatores preditivos para a gravidade da evolução. Assim, realizaram um estudo com 132 pacientes no Setor de Doenças Neuromusculares da Universidade Federal de São Paulo.  A média de início dos primeiros sintomas foi de 39,4 anos. Os mais comuns apresentados pela amostra foram: a fadiga (87,1%), as dores musculares (82,4%) e as dores articulares (72,0%). Os pesquisadores concluíram que os profissionais envolvidos diretamente no atendimento dessa clientela devem ser minuciosos na avaliação inicial e no acompanhamento, além de atentarem para as implicações negativas do “supertreinamento” durante o período de recuperação. Segundo as diretrizes da Sociedade Europeia de Neurologia, fundamentadas a partir de pesquisas aos principais periódicos de expressão científica, os pacientes com SPP necessitam de intensa supervisão. Com relação à dor, os pesquisadores alertaram que o treinamento muscular inadequado pode exacerbá-la e contribuir para episódios agudos (Nível B). Perda de peso, utilização de equipamentos de assistência e suporte devem ser considerados devido a satisfatórios resultados práticos obtidos. Inúmeros tratamentos para SPP foram concluídos. Entretanto, no que tange ao gerenciamento da dor, nenhum efeito terapêutico definitivo tem sido relatado para os agentes farmacológicos utilizados, como piridostigmina, corticóides e amantadine. Novos estudos randomizados (clínicos e de reabilitação) devem direcionar-se para o tratamento da dor, um sintoma comumente relatado pelos pacientes com SPP. Em adição, é necessário que haja pesquisas de longo prazo para caracterização dos efeitos em um tempo mais prolongado do treinamento muscular.
CONCLUSÃO Os resultados deste relato de caso apontam para uma possibilidade real no gerenciamento da dor por parte da intervenção fisioterapêutica. Nossos dados sugerem melhorias sobre as sequelas tardias da poliomielite. Inúmeros tratamentos clínicos têm sido testados e utilizados para o gerenciamento da dor em pacientes com SPP. Entretanto, a adesão e um correto esclarecimento sobre o tipo, frequência e intensidade dos programas ainda são escassos na prática clínica e na literatura vigente, principalmente no âmbito da abordagem fisioterapêutica. Embora o presente trabalho apresente limitações de um relato de caso, tais reflexões são de grande importância para a formulação de no- vos estudos, com um tamanho amostral expressivo, preferencialmente ensaios clínicos randomizados-controlados. Assim, poderemos elucidar quais são as estratégias mais eficazes para gerenciamento da dor na SPP.

16 janeiro 2014

Pólio na Síria e em Israel ameaça a Europa.


Por Declan Butler e Revista Nature

Para muitos europeus, a poliomielite é um inimigo do passado. Mas, pela primeira vez em nos, existe um risco de que a ameaçadora paralisia esteja prestes a retornar. O póliovírus ressurgiu no limite sudeste da Europa – em Israel e na Síria – deixando autoridades de saúde pública preocupados com a doença, que pode ser importada e se estabelecer mais uma vez no continente.

A Europa é surpreendemente vulnerável. A Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a região europeia, atualmente com 53 países de Portugal à Rússia, livre da pólio em 2002. Desde então, muitos países baixaram a guarda. Sistemas de vigilância frequentemente incompletos e de baixa qualidade, além de taxas de vacinação abaixo do ideal significam que muitos países, incluindo o Reino Unido e a Alemanha, são considerados suscetíveis a surtos iniciados por casos vindos do exterior.

A situação é um “sinal de alerta”, declara Marc Sprenger, diretor do Centro Europeu de Prevenção e Controle de Doenças (ECDC) em Estocolmo. Dadas as fraquezas nas defesas europeias contra a pólio, os níveis extensos de viagens entre Europa e Israel, e os milhões de refugiados deixando a Síria, o ECDC acredita que existe um risco real de surtos na União Europeia (UE). Estados-membros estão levando a ameaça de importação [da doença] “extremamente a sério”, adiciona Sprenger.

O esforço para erradicar a pólio deu grandes passos desde o lançamento da Iniciativa Global de Erradicação da Pólio, em 1988. Naquela época, 350 mil crianças, em 125 países, sofriam com paralisia todos os anos. Esses números foram reduzidos em mais de 99% nos últimos 25 anos, com apenas 223 casos no ano passado. Atualmente a pólio é endêmica em apenas três países: Afeganistão, Nigéria e Paquistão. Casos importados esporádicos, no entanto, continuam a ocorrer, particularmente na África; um surto na Somália provocou 174 casos até agora.

A ameaça mais recente surgiu em 19 de outubro, quando a OMS relatou um conjunto de casos de paralisia flácida aguda – um sintoma clássico da pólio – em Deir-ez-Zor, uma província em conflito no leste da Síria. Dois dos 22 casos foram confirmados como pólio por autoridades nacionais e, em 29 de outubro, a OMS confirmou um total de 10. As autoridades acreditaram no pior. “Todos os casos estão se transformando em surtos”, contou à Nature Oliver Rosenbauer, porta-voz da Iniciativa Global de Erradicação da Pólio na OMS em Genebra, na Suíça.



A AMEAÇA DA PÓLIO

Alguns países europeus correm mais riscos de um surto de pólio iniciado por casos estrangeiros, devido à pouca vigilância e a taxas de vacinação abaixo do ideal

 

Fonte: Organização Mundial de Saúde. Report of the 27th Meeting of the European Regional Certification Commission for Poliomyelitis Eradication (WHO, 2013), in Scientific American (http://goo.gl/DhD0Qf)



Os casos provavelmente são resultado de uma queda brusca nas taxas de imunização infantil na Síria, devido à guerra em andamento. Como a tendência é que existam cerca de 200 casos não-sintomáticos de pólio para cada caso de paralisia, o cojunto de casos provavelmente é “apenas a ponta do iceberg”, observa Sprenger. Existe um grande risco de a doença se tornar endêmica na Síria, adiciona Rosenbauer.

Israel enfrenta uma situação diferente, mas também preocupante. O país tem altos níveis de imunização infantil contra a pólio, mas um póliovírus diferente foi encontrado no esgoto de várias cidades ao sul de Israel desde fevereiro. O vírus também foi detectado na Cisjordânia e em Gaza. O ECDC e a OMS estimam um alto risco de disseminação internacional do póliovírus a partir de Israel, dada a prolongada circulação do vírus sobre uma grande área.

Até o momento, Israel identificou 42 pessoas eliminando póliovírus em suas fezes. Nenhuma delas tinha sintomas de paralisia, e todas tinham sido completamente imunizadas com a vacina inativada de poliomielite (VIP), que é usada em imunizações de rotina e protege contra todas as cepas de pólio. Essa é a primeira vez em que um vírus diferente de pólio foi encontrado sem quaisquer casos clínicos.

A maioria dos países europeus usa a VIP, e se expostos à pólio estrangeira eles poderiam ter que enfrentar a disseminação silenciosa do vírus também no ambiente, o que colocaria em risco populações não-vacinadas, particularmente crianças. A VIP concede um alto nível de proteção individual, mas fornece pouca imunidade intestinal, o que significa que pessoas vacinadas ainda podem espalhar o vírus através de fezes.

Uma alternativa é a vacina oral contra a poliomielite (VOP), uma forma enfraquecida do vírus vivo que fornece uma grande imunidade intestinal e evita a disseminação fecal. Ela é usada para vacinações em massa e controle de surtos por ser eficaz, barata e fácil de administrar. Em casos raros, porém, a vacina pode provocar a doença, então países livres da doença preferem usar a VIP, que não carrega esse risco.

Para deter a transmissão silenciosa, Israel administrou a VOP para mais de 890 mil crianças desde agosto, e a Síria começou a administrar a VOP para 2,4 milhões de crianças. A OMS e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) estão planejando uma campanha de vacinação em todos os países vizinhos. A aparição da pólio “terá implicações além da Síria”, prevê Rosenbauer.

Os eficazes sistemas de vigilância de esgoto de Israel conseguiram detectar o vírus antes de ocorrer quaisquer casos clínicos ocorrerem mas, na Europa, apenas alguns países monitoram os esgotos.

A vigilância da paralisia flácida aguda também é frequentemente fraca. O risco de que casos importados possam passar sem detecção e se espalharem antes de provocarem surtos é real, alerta Sprenger. Europeus vacinados estariam protegidos. Mas em muitos países, incluindo Ucrânia, Romênia e até algumas nações mais ricas, as taxas de vacinação contra a pólio podem estar abaixo do ideal. Cerca de 12 milhões de crianças da União Europeia não estão vacinadas contra a pólio.

 “Nós precisamos melhorar a vigilância ambiental e não esperar até termos um caso clínico de pólio”, conclui Sprenger.

Uma Análise dos Efeitos Tardios da Poliomielite

Após o desenvolvimento das vacinas de Salk (1955) e de Sabin (1961), a poliomielite (ou paralisia infantil) foi erradicada de quase todos as países do mundo. Em 1995, registaram-se 6197 casos de poliomielite em todo o mundo; em 1996 foram identificados 3995 casos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) calcula existirem cinco a dez vezes mais casos de paralisia do que os constantes nos relatórios, contudo, a identificação de novos casos é cada vez mais rigorosa. A OMS declarou como objectivo para o ano de 2000 a total erradicação da infecção aguda pelo vírus da poliomielite.
Os cálculos da OMS estimam existirem 12 milhões de pessoas em todo o mundo com algum grau de limitação física causada pela poliomielite. Os dados preliminares de uma pesquisa realizada pelo Centro Nacional de Estatística de Saúde dos Estados Unidos apontam para a existência de cerca de 1 milhão de sobreviventes naquele país, dos quais cerca de 433.000 sofreram paralisias de que resultam diferentes graus de limitações motoras. Os sobreviventes de poliomielite viveram durante décadas uma vida activa, esquecendo terem sofrido a infecção da poliomielite, e apresentando um estado de saúde estável.
Nos finais da década de 70, os sobreviventes da poliomielite começaram a sofrer de novos problemas tais como fadiga, dor, e fraqueza geral. Em meados da década de 80, os agentes de saúde reconheceram esses novos problemas como sendo reais e não "apenas imaginados pelos pacientes." Desde essa altura têm vindo a ser conduzidos, nos institutos de investigação e centros médicos, estudos sobre este fenómeno chamado de "síndroma pós-pólio".

Os sintomas podem incluir:
  • Uma fadiga fora de vulgar - quer um cansaço muscular súbito, quer uma sensação generalizada de exaustão.
  • Novo enfraquecimento dos músculos, quer dos que foram originalmente afectados, quer daqueles que não foram afectados.
  • Dores nos músculos e/ou nas articulações.
  • Perturbações do sono.
  • Dificuldade de respiração.
  • Dificuldade de deglutição.
  • Diminuição da capacidade de tolerância de temperaturas baixas.
  • Redução na capacidade de efectuar as actividades diárias, tais como andar, tomar banho, etc.
Estes sintomas gerais, não devendo ser apenas considerados como consequências do envelhecimento, podem produzir diversos graus de incapacidade e a evolução destes pode manifestar um carácter insidioso. Estudos recentes apontam para o facto de os anos de vida em que uma pessoa infectada viveu com o vírus da poliomielite representarem um factor de risco equivalente ao factor envelhecimento. Aparentemente, as pessoas inicialmente atingidas pelo vírus da paralisia infantil, e que recuperaram grande parte das suas capacidades funcionais, apresentam nesta fase das suas vidas mais problemas do que aqueles que tiveram uma infecção inicial menos severa.

Um diagnóstico por exclusão
Não existe ainda qualquer teste conclusivo que permita determinar as causas para este conjunto de sintomas. Verifica-se alguma confusão, não só entre os sobreviventes da poliomielite, mas também entre os seus familiares e entre os próprios profissionais de saúde, devido a uma certa confusão relativa à terminologia utilizada. é importante ver os problemas da síndroma pós-pólio de acordo com as categorias a seguir referidas, tendo em conta que os conjuntos de sintomas não podem ser vistos individualmente mas fazendo parte de um todo.
A categoria mais ampla e inclusiva designa-se por efeitos tardios da poliomielite ou sequelas da poliomielite, e compreende um conjunto específico de novos problemas de saúde originados pelo vírus da poliomielite e caracterizados por uma crónica perda de capacidades motoras, como por exemplo, artrite degenerativa resultante do desgaste excessivo das articulações ou a síndroma do canal cárpico, assim como outros problemas recorrentes de locomoção, como a tendinite, a bursite, o enfraquecimento dos ligamentos das articulações e a tensão excessiva das articulações resultante de movimentos compensatórios do corpo.
A síndroma pós-pólio é uma sub-categoria dos efeitos tardios da poliomielite e é definida como um novo conjunto de sintomas de enfraquecimento muscular, fadiga e dor, resultando numa diminuição da capacidade funcional e/ou no surgimento de novas incapacidades. A maioria dos médicos usa os seguintes critérios para diagnosticar a síndroma pós-pólio:
Ocorrência de graves paralisias resultantes da poliomielite. A maioria dos médicos efectua um electromiograma (EMG) de forma a documentar alterações que apresentem compatibilidade com as primeiras sequelas da infecção de poliomielite.
Recuperação seguida de vários anos de estabilidade no período que medeia entre as primeiras manifestações da poliomielite e o aparecimento de novos problemas, que podem incluir: gradual ou súbito enfraquecimento dos músculos afectados e/ou dos músculos aparentemente não afectados, podendo ou não ser acompanhado por fadiga excessiva, dores nos músculos e/ou nas articulações, diminuição da resistência muscular, alterações funcionais e atrofia muscular.
  • Deverão ser excluídas outras patologias que possam estar na origem dos problemas mencionados.
  • Uma sub-categoria da síndroma pós-pólio é a atrofia muscular progressiva da pós-pólio, que se define por um novo enfraquecimento progressivo e atrofia dos músculos com sinais clínicos ou sub-clínicos de denervação ou reinervação compatíveis com a infecção aguda pelo vírus da poliomielite.
  • Os sobreviventes da poliomielite podem experimentar um ou mais dos problemas anteriormente descritos, não devendo preocupar-se desnecessariamente em categorizar esses sintomas.
  • Os sobreviventes da poliomielite podem, naturalmente, manifestar os mesmos problemas de saúde que a população em geral, problemas que podem exibir sintomas semelhantes aos da síndroma pós-pólio, enquanto outros podem ser ampliados devido à lesão neurológica causada pela infecção aguda do vírus da poliomielite.
A opinião consensual sobre as causas que originam os sintomas da síndroma pós- - pólio concentra-se nas células nervosas e correspondentes fibras musculares. Quando o vírus da poliomielite danifica ou afecta os neurónios motores, as fibras musculares tornam-se "órfãs", resultando na paralisia dos músculos. A recuperação de alguns movimentos deve-se a um certo grau de regeneração das células nervosas, enquanto que a subsequente recuperação dos movimentos é atribuída à capacidade das células nervosas vizinhas não afectadas de se "desenvolverem" e restabelecerem a ligação com os músculos "órfãos". Após viverem anos com este sistema neuromuscular reestruturado, os sobreviventes da poliomielite experimentam neste momento as consequências, isto é, a sobrecarga das células nervosas que sobreviveram e o uso excessivo dos músculos e articulações, combinado com os efeitos do envelhecimento. Se bem que continuam os estudos para determinar a existência de uma causa viral, não existem ainda conclusões que sustentem a tese de que a síndroma pós-pólio resulta de uma re-infecção do vírus da poliomielite.
Os primeiros passos na prevenção e acompanhamento .
Os sobreviventes da poliomielite devem ser avaliados por um médico de clínica geral, sendo de seguida objecto de uma avaliação especializada neuromuscular por um especialista experiente em poliomielite, a fim de estabelecer as suas condições físicas, permitindo avaliar alterações futuras e elaborar um programa de tratamento apropriado. A International Polio Network publica anualmente uma lista de clínicas e de profissionais de saúde especializados no acompanhamento de pessoas sobreviventes da poliomielite.
Os sobreviventes da poliomielite devem, em primeiro lugar, manter-se atentos aos cuidados de saúde primários, procurando assistência médica periódica. Deverão ser cuidadosos com a sua alimentação, evitarem ou diminuírem o excesso de peso, deixarem de fumar ou de beber bebidas alcoólicas.
Os sobreviventes da poliomielite devem manter-se atentos ao seu próprio corpo. Devem evitar actividades que possam causar dor - a dor é um sinal de aviso. Devem evitar tomar analgésicos com frequência, particularmente narcóticos. Não devem usar os músculos de forma excessiva, devendo manter uma actividade regular que não agrave os sintomas. Sobretudo, não devem manter actividades físicas que sejam acompanhadas por dores. Devem evitar as actividades que, após um período de dez minutos, provoquem a fadiga.
Os sobreviventes da poliomielite que manifestem alguns dos sintomas acima descritos deverão manter uma disciplina nas suas actividades diárias, descansando sempre que necessário, fazendo períodos de repouso de 15 a 30 minutos sempre que sintam essa necessidade, várias vezes ao dia. A gestão das suas actividades pode incluir uma maior utilização de equipamentos compensatórios. Recomenda-se também, sempre que necessário, a mudança de aparelhos ortopédicos.
Os sobreviventes da poliomielite devem procurar o máximo de informação. O International Polio Network, através de conferências e publicações tais como o Manual Acerca dos Efeitos Tardios da Poliomielite, para Médicos e Sobreviventes e a Post-Polio Health, disponibiliza informações rigorosas e relevantes. Uma outra forma de obter informações é através do estabelecimento de contactos com outros sobreviventes da poliomielite. O Post-Polio Directory contém uma lista com mais de 300 grupos privados de apoio de todo o mundo.
A Post-Polio Health International (PHI), é uma rede de apoio sem fins lucrativos que tem por principal objectivo fornecer informações de relevância relativamente aos efeitos tardios da poliomielite. O PHI, fundado por Gini Laurie, é conhecido desde 1958 pelo seu trabalho em rede, o que lhe valeu a reputação de "factor unificador entre os sobreviventes da poliomielite de todo o mundo". O PHI também é responsável pela publicação de um boletim, Ventilator-Assisted Living, destinado às pessoas que necessitam de utilizar um ventilador, para além de publicar a Rehabilitation Gazette.
Todas as dúvidas e perguntas serão sempre bem-vindas.
Joan L. Headley, Directora Executiva
Post-Polio Health International (PHI)
director@post-polio.org
www.post-polio.org
Associação Pós-Pólio de Portugal
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